quinta-feira, 27 de novembro de 2014

O BOB ESPONJA DO AMOR E AS NOSSAS DIVINDADES

Ainda hoje, tenho o hábito de bradar a minha má sorte para quem quiser ouvir. “Sou zicado”, vivo dizendo, sem pudor algum. Tudo bem que Murphy parece insistir em fazer valer a sua sina em minha humilde existência vez por outra. Botar o pé na rua e começar a chover, ver o ônibus passar logo antes de chegar ao ponto, ser o único da turma presenteado com uma lagarta de alface no sanduiche, dentre outras coisas, às vezes me faz crer que esse cretino tem um carinho especial por mim.
“Carinho especial por mim“. O que me leva a crer que mereço tamanha atenção, especialmente de uma figura tão importante? Não é qualquer ser vil que me pune com suas leis, trata-se praticamente de uma entidade universal, um ser dotado de poder e de magia, por mais nefasto que seja.
Porque estamos sempre pensando, e até mesmo sentindo os eventos da vida dessa forma? Por qual motivo nossa percepção insiste em direcionar tudo diretamente para o centro dos nossos umbigos? “Eu, eu, eu!”. Soa tão desesperador... Como vem dizendo um iluminado em sua canção: “Rir é bom, mas rir de tudo é desespero”. Talvez um dia eu entenda melhor dessas coisas, mas por ora me abstenho em desvendar mais um mistério. O que me importa é que não sou tão especial assim. Não posso ser. Duvido que Murphy ou qualquer outra divindade venha gastando seu tempo olhando para mim com tamanha atenção. Eu, eu, eu...
Também é incrível como temos o prazer de voltar nossos olhos para as desventuras. O azar, percebo, é encontrado em qualquer esquina, em qualquer situação digna de incômodo à nossa supervalorizada existência, afinal, porque justo eu deveria estar sendo tão perturbado por uma infinidade – e infimidade - de desprazeres? Só pode ser um plano macabro para tornar a minha vida muito mais difícil e desafiadora.
Ah, mas a sorte, não! Ela é discreta e sublime. Exige uma preparação de semideus para ser desvendada. É necessário realizar o árduo trabalho de suspender parte das nossas queixas e daquele ruído interno que nos direciona, dia após dia, ao descontentamento.
Me parece, sem muitas dúvidas, um trabalho para semideuses.
Contudo, confesso-me tremendamente errado em todas as vezes que exibo meus infortúnios. Tenho, na verdade, muita sorte. Sorte que pode se revelar, por exemplo, na simples figura de um amigo. Um brother que levarei pra vida toda. Não digo “melhor amigo”, pois tal expressão carrega certa perversão ao qualificar nossos bons companheiros de forma tão emblemática.
Ilustro minha sorte admirando e contrastando nossas notáveis diferenças nos mais variados aspectos, todavia, preciso me ater em apenas alguns pontos. Contrario a mim, que passei boa parte da vida levantando a bandeira do ceticismo, este amigo é supersticioso. Do tipo, realmente muito supersticioso, pelo menos sob meu olhar.
Lembro-me de quando éramos jovens (como dói falar isso!), vivíamos jogando Winning Elleven no nosso saudoso Playstation 1. Meu Deus, qual leitor aqui pegou desde o início a época deste vídeo game? Torço para que sejam muitos. Havia uma puta rivalidade entre nós, a ponto de certa vez quase sairmos no tapa. Todo jogo era acirrado, dificilmente alguém ganhava por mais de um gol de diferença e as melhores de 5 sempre terminavam 3x2. Era a técnica da minha Inglaterra de Beckham, Owen e Scholes contra a força da sua Argentina de Batistuta, Verón e Claudio Lopez. Ainda hoje guardo com carinho uma camisa da seleção inglesa em memória a essa época. Era realmente fantástico.
Em uma de nossas jogatinas, eu tomei uma sonora goleada de 10x0. Não, eu não zoei no jogo, não fiz gracinha. Joguei sério do início ao fim. Tomei uma nabada pra não esquecer mais. E não esqueci. Fui embora cabisbaixo e remoí aquilo durante um bom tempo.
Meses depois, mais uma vez estávamos lá, mergulhados no nosso clássico. Estava rolando uma festinha na casa dele, comes e bebes liberados e o Winning Elleven comendo solto. Aquele cenário, para nós, era uma espécie de paraíso. Nesse dia, comecei abrindo o placar. 1. 2. 3. 4 a 0! Estava tudo lindo, quando ele começou a botar a culpa em seu tio. “Tio Zózó”, jamais o esquecerei.
O pior é que o coitado do Zózó realmente passava na porta do quarto dele toda vez que eu fazia gol, e não tardava a levar toda a culpa. “Zózó passa na porta e eu tomo gol, véi! Tomar no cu!”. E assim seguiu, até eu balançar as redes 11 vezes. 11 a 0. E não, ele também não entregou o jogo, não fez gracinha. Pelo contrário, só esbravejou o tempo todo. O destino de tamanha ira? Tio Zózó.
Não era só desculpa e muito menos brincadeira por parte do meu grande amigo, ele realmente acreditava com uma convicção inabalável que sofreu a maioria dos gols por causa das aparições do seu tio. Depois disso, fechou a porta e só continuo a jogar com ela fechada. E o pior é que os resultados voltaram ao normal depois disso, eternizando sua crença de que o culpado de tudo era o pobre Zózó. Pra mim, o que importa é que devolvi a épica talascada, e com acréscimo!
Ao longo dos anos da nossa amizade, várias foram as expressões da sua superstição. A mais marcante delas aconteceu quando fui presenteado por ele com um Bob Esponja de pelúcia. Não me lembro exatamente como ele se apossou dessa criatura, mas ao oferece-la a mim, demonstrou plena convicção de que ele era imbuído do poder de “trazer sorte com as meninas”. Bastava coloca-lo em algum lugar visível do meu quarto que a coisa aconteceria. Dizia que já tinha funcionado com ele, e que agora era a minha vez de usufruir do feitiço. A título de curiosidade, hoje ele se encontra noivo de uma bela garota e tudo vai bem entre eles.
Parece ter funcionado.
Ainda me pergunto o que o motivou a conceder-me seu totem. Talvez por desapego e por não desejar ter tudo apenas para si. Ou por ter percebido que a minha fase não era das melhores, que a maré não estava para peixes. Acho que as duas coisas e talvez algumas mais. Aceitei não apenas o presente, mas abracei também todas as suas intenções, tomando emprestado seu forte valor supersticioso. Fiz exatamente o que me foi recomendado, e até hoje o Bob Esponja reside no meu quarto, sobre alguns livros.
Se alguém ficou curioso para saber se funcionou ou não, vai ter que esperar mais alguns parágrafos. Antes, chamo a atenção para a forma com que alguns de nós tratamos a questão das crenças e superstições.
Passei parte da vida discutindo comigo mesmo e com os outros sobre a minha orientação religiosa, ou não religiosa, sempre ávido em me posicionar e em reconhecer minha falta de crenças em algum desses chavões que fizesse sentido, especialmente se pudesse quebrar com o convencionalismo e conservadorismo.
Hoje, alguns anos adiante na estrada da vida, pouca atenção dou ao caso. Não que as minhas criticas tenham me abandonado ou que abdiquei de me posicionar, não se trata disso. Sinceramente, pouco me importa se sou isso ou aquilo. Tenho as minhas convicções, compreendo que são as minhas e de mais ninguém e por ora isso basta. E compreendo ainda que cada um tem as suas próprias e que isso é o bastante para ambos.
Hoje – diferentemente de outrora – sinto-me grato ao ouvir expressões como “Deus te abençoe” e “Que Jesus te perdoe”, esta última, quando cometo alguma infâmia. Sim, desejo que Deus me abençoe, não por adorar tal divindade, mas por compreender – quando isso de fato acontece – que o outro quer que eu receba uma benção. Também quero receber o perdão de Jesus, caso ele realmente detenha tamanho poder e, especialmente, se eu tiver agido tão mal assim. Que todos os Orixás me concedam boas energias e que a sabedoria dos Pretos Velhos possam ser passadas para mim ao longo dos anos. Que gradativamente nos desarmemos das nossas convicções tão fúteis, pelo menos frágeis quando colocadas diante de intenções tão nobres. Simples, puras e louváveis intenções, ainda que despidas de qualquer flâmula.
E que o Bob Esponja seja capaz de me trazer sucesso com as garotas.
O Bob é realmente mais sagaz do que julguei a principio. Vencendo minha resistência, sua magia revelou-se real e trouxe algumas agradáveis surpresas. É verdade que o fato narrado já aconteceu há mais de ano, logo, não relato nenhuma experiência recente. Na época, entretanto, algumas estranhas coincidências aconteceram. Não me tornei moreno alto, bonito e sensual e muito menos saí fazendo sucesso por ai, não foi nada disso. Sem entrar em muitos detalhes, aconteceram algumas situações, até então, pouco prováveis. Mas que só foram possíveis mediante a força do Bob.
Talvez, ao ser presentado com a dádiva contida na pelúcia de um personagem de desenho animado, uma parte pouco acessível do meu ser fora ativada com o intuito de fazer com que as coisas acontecessem, mas prefiro crer em seu poder. Bob Esponja do Amor é como o chamo.
Hoje, repousando tranquilo em meu quarto, posso dizer que ele cumpriu sua missão. Transportou os votos de sucesso que fizera um grande amigo. Um ato nobre, que tem me servido mais para repensar a forma com que lido com minhas crenças, meus valores, meu ceticismo e especialmente minha abertura às outras pessoas do que para cumprir sua missão principal.
Quero seguir o exemplo que me foi dado e continuar a corrente do Bob Esponja do Amor. Seu milagre já foi operado em mim e agora é hora de fazer o mesmo por outra pessoa. Que carregue bons ares – quiçá feromônios – a outrem e que isso se repita muitas vezes mais.
Meu companheiro Bob Esponja está com os dias contados aqui em casa, no meu quarto. Mas o aprendizado que pude obter com ele e com um bom amigo, perdura. Neste momento, sinto-me envergonhado de ter iniciado este texto exibindo minha pequena quota de azar.
Seja pelos signos, pela cruz, pelo cachimbo ou pelo Bob Esponja do Amor, torço para que um dia sejamos capazes de compartilhar com harmonia e alegria as nossas crenças e possamos brindar a beleza que existe no fato de sermos mais de sete bilhões de pessoas tão diferentes.

domingo, 9 de novembro de 2014

EU NÃO SOU O ROCKY BALBOA (E ESSE NÃO É UM CAPÍTULO DO LIVRO)

É fim de tarde de uma sexta-feira nem tão quente assim. Já tivemos piores. Estou prestes a adentrar um shopping center enquanto o tímido sol sobre a montanha se prepara para sair de cena. Neste momento a maioria das pessoas já sentem os ânimos pululando e suas preocupações giram em torno de decidir qual será o lugar e a companhia da noite. Eu, não. Na verdade eu nem deveria estar aqui, não por ter aversão a esse tipo de lugar como ousava afirmar quando era mais novo. A idade, ainda que não muito tardia, traz consigo alguma indiferença.
Ao sair do trabalho, fui desviado da rota de todos os dias por qualquer motivo mundano que a menção não vale a pena. Tomei outro caminho, contemplei outras paisagens urbanas e desemboquei aqui, neste grande templo de compras e vendas, de prazeres e sacrifícios. Sinto-me animado, pois não me lembro qual foi a ultima vez que fizera um programa como este, andando por ai descompromissadamente, acompanhado apenas dos meus pensamentos. De alguma forma, me sinto... Livre. E leve. Entro sem saber exatamente o que faria ali. A única certeza é de que acabaria na praça de alimentação. Contudo, observo as vitrines com alguma atenção e visito duas ou três lojas, na esperança de que alguma coisa chamaria a minha atenção e conquistaria o meu limitado capital. Poderia, então, sentir-me parte daquele grupo, daquelas pessoas.
Tudo em vão.
Invariavelmente sigo para a praça de alimentação, e, sem muita dificuldade, escolho o lugar para saciar minha fome: Burger King. Aguardo a fila com paciência sem me atentar muito às pessoas ao meu redor até que, enquanto espero pelo meu pedido, vejo duas jovens garotas – ou nem tão jovens assim – pedindo outro copo descartável para o atendente. Pedido negado. Só então me dou conta de que o refrigerante é liberado. Open bar. Como foram espertas! Compraram apenas um combo e pagaram mais barato no outro sanduiche. Já que era refil de refrigerante, beberiam juntas pelo preço de um só. Pelo menos conseguiram um canudinho adicional e a estratégia funcionaria.
Senti-me tacanho diante de tamanha perspicácia daquelas garotas. Porque eu nunca havia pensado nisso? Provavelmente minha mente caótica esteve ocupada com outros detalhes de menor importância prática, enquanto eu deixava escapar aquela oportunidade de levar vantagem. De enganar toda uma franquia. Eu poderia ter trapaceado o Rei dos Hambúrgueres, mas não estive atento. Pergunto-me qual foi a ultima vez que me senti esperto, que havia levado alguma vantagem apenas por ser inventivo. Foi difícil me lembrar.
Calmamente chego à minha mesa de dois lugares para finalmente comer. Observo as garotas compartilhando o mesmo copo de refrigerante, porém com dois canudinhos diferentes. Sinto certa alegria e satisfação ao assistir aquela cena. Enquanto desfruto do sabor do sanduiche e das batatas, observo mais atentamente o lugar. Quase todos estão acompanhados dos pares. Dos seus pares. Apegados a essa mania de contabilizar o outro como posse ou qualquer coisa do tipo. Divago – como de costume – sobre este sintoma. O que leva as pessoas a chamarem seus companheiros de meu namorado ou minha esposa? O que de fato as leva a acreditar que são suas, quando na verdade por um simples capricho elas podem desistir da relação e deixar o outro a ver navios?
No fundo, não me encontro em condições de criticar as pessoas, quando eu não faço muito diferente. Naquele momento, sou invadido pela lembrança da minha garota, aquela que há anos me acompanha, todos os dias, sem cessar. Pelo menos em pensamento. Suponho onde ela estaria agora e o que estaria fazendo, sem grandes dificuldades. Há longos anos conheço a sua rotina, mais do que gostaria.
Percebo – enganosamente ou não – que não é raro sujeitarmos nossa felicidade, ou pelo menos a nossa satisfação e segurança à outra pessoa. Desde que sejamos um do outro, está tudo bem. Noutros tempos, afirmaria com convicção que sou autossuficiente e estou imune a este perigo. No entanto, a vida vem me mostrando, com um sucessivos socos bem no centro da face, que as coisas não são bem assim. Hoje seguindo só adiante em uma estrada meio soturna, não sustento tamanha certeza. Alguns nocautes no ringue da vida me fizeram perder perder um pouco da coragem de outrora, aquela doce coragem jovial. Não mais sou tão destemido assim. Eu não sou o Rocky Balboa¹.
Decidi me render.
Volto a assistir às duas garotas vencedoras. Desejei uma companhia. Desejei poder mostrar ao meu par que sou esperto, provar que posso vencer o Rei daquela província ou franquia. Novamente a minha garota me vem à mente, acompanhado da vontade de ter sua companhia, pelo menos até terminar de comer. Novamente, em vão. Ela se foi. Por algum capricho, ou não, eu não poderia continuar chamando-a de "minha". Porque eu insistia em chama-la dessa forma? Talvez porque eu ainda sinto que seja. Contudo, ela se foi, decidiu partir há alguns anos e eu insisto em agir dessa forma. Minha. No fim das contas, deliberadamente me rendi - e tenho sido vencido - pelo hábito. Afinal, eu não sou o Rocky Balboa.
Mas não há grande desagrado em estar só. Na verdade, estou mais leve assim. Dou-me conta que ali, naquela praça de alimentação, quase de frente um para o outro, existem dois concorrentes do Rei dos Hambúrgueres. Suas placas, cartazes e cardápios são adornados por uma profusão de cores e luzes, sem contar as fotos de pessoas felizes e sorridentes capazes de nos fazer acreditar que estamos engolindo tal felicidade.
Volto a apreciar o gosto daquela guloseima bem na minha frente. Realmente, parece mágica, uma mágica proferida por aqueles garotos de boné atrás do balcão que provavelmente não tiveram muita escolha senão trabalhar para contribuir com a decadência da nossa saúde. Tento desligar meus outros sentidos e me atentar apenas ao paladar. A sensação é quase divina. Posso sentir o gosto da carne, do bacon, do molho, da gordura. Tudo parece ser cuidadosamente estudado e calculado, para que a soma das partes seja maior que o todo.
Naquele momento, estou convencido de ter comprado toda a felicidade daquelas propagandas. O preço? Não é apenas o dinheiro gasto ali, que por si só não é tão pouco assim. Pago também com parte do meu vigor. Ele não me faz tanta falta agora, contudo, poderá fazer em algum momento. Parece um contrato: a cada mordida, uma parte da minha vida – mesmo que ínfima – fica por ali. Parece valer a pena.
Inesperadamente, o alarme de alguma daquelas franquias começa a tocar. Um som alto, agudo e repetitivo. Totalmente irritante. Certamente alguém está tomando esporro do seu superior naquele momento. – sempre tem alguém pior que a gente – penso, sem hesitar. Me sinto um pouco melhor, aquela perturbação não é grande coisa assim, afinal, é sexta-feira. Amanhã sequer preciso acordar cedo, não há motivos para estresse. Entretanto, as pessoas ao meu redor parecem se incomodar cada vez mais, algumas até se levantam e vão embora. Não consigo deixar de questionar se o alarme as fizera partir ou se o tempo delas naquele lugar simplesmente havia terminado.
Terminado o lanche, preparo-me para ir embora. Levo minha bandeja e meu lixo até a lixeira. Preciso cumprir meu papel de cidadão polido e consciente. Na estante de bandejas, identifico diversas cores, provavelmente pertencentes a estabelecimentos diferentes. Todas estão misturadas: um caos. Coloco a minha em cima de uma bandeja de outra cor, conscientemente visando alimentar o caos. Provavelmente existe uma pessoa na praça de alimentação designada para separar e enviar cada bandeja ao seu fiel destino. E é assim que as coisas acontecem. Quando tudo vai mal, aparece alguém para consertar as coisas, trazer ordem e exterminar o caos. Até que outras pessoas apareçam no dia seguinte, trazendo consigo toda a sua bagunça.
Direciono meus passos sem um destino muito especifico. Não me parecia tão difícil chegar até a saída. Basta caminhar e em algum momento a saída se fará notar. Alguns metros à frente, reconheço uma bela garota. Enamorada de um... tive dificuldades para rotular. Não era um grande amigo, tampouco um simples conhecido. Às vezes os rótulos são insuficientes e mais atrapalham do que ajudam, mas não me demorei na tarefa de encaixá-lo em algum termo.
Minha atenção foi desviada para a pessoa ao lado dela. Um desconhecido. Um rapaz de boa afeição e porte quase atlético. Faço com que ela não me veja enquanto ganho alguns segundos para observar melhor a cena. Sorrisos fáceis, mão com mão e até carícias. Elementos quase suficientes para encaixá-la no adultério, pelo menos na minha mente.
Finjo que não vejo. Finjo que não julgo. Continuo meus passos em direção à saída. O companheiro daquela garota? Jamais ficaria sabendo do acontecido. Não através de mim. Saio do Shopping e me deparo com a escuridão da noite tentando ser combatida pela iluminação urbana. Não havia me dado conta de que passara tanto tempo. O tempo correu rápido, uma surpresa agradável e um bom sinal. Ignoro as luzes da cidade e fito o mar negro que se instalara sobre minha cabeça. Sempre tive a sensação de a noite me oferecer acolhimento, pelo menos um descanso para os meus olhos e para a minha mente. Enquanto caminho em direção ao ponto de ônibus, consigo, com algum esforço, contar algumas estrelas. Elas pareciam tímidas, portanto não era uma noite muito clara.
Já no ônibus e a caminho de casa, percebo o quão exausto estou. Foi um dia cheio, e, apesar de agradável, o passeio urbano me fez repensar uma série de coisas. Dizem que a adolescência é a fase das incertezas, mas lembro de ter sido muito mais firme e convicto naquela época. A estrada até os vinte e tantos anos me trouxe uma série de dúvidas, as quais não faço menção de me livrar. Volto a contemplar o céu, escuro e vazio enquanto o transporte coletivo encurta o caminho até minha casa.
Sinto-me não perdido, mas à deriva, naquela vasta escuridão, com poucas estrelas disponíveis para me guiar. Houve um tempo, contudo, que a escuridão era completa e não havia estrela alguma. A presença desses pequenos e esparsos pontos de luz me fazia otimista. Eu não poderia perder a vontade de navegar enquanto eles estivessem por ali, oferecendo resquícios de prazer, satisfação e alegria. Como uma mudança de rota inesperada, como as paisagens urbanas, como a perspicácia de duas garotas, como um bom sanduiche e batatas fritas, como os casais em uma praça de alimentação, como um alarme ensurdecedor, como o possível adultério de uma pessoa conhecida, como uma surpresa agradável ao cair da noite.
Prestes a chegar em casa, ainda em atividade mental intensa, ao fazer uma breve retrospectiva dei-me conta de quantas coisas já abri mão. De quantas vezes havia me rendido. Eu não sou o Rocky Balboa, entretanto nem tudo é derrota. É a ordem natural das coisas. Uma ultima olhadela para o alto antes de entrar me fez perceber quanto espaço há no céu para novas estrelas. Eu não sou o Rocky Balboa, estou mais para Rustin Cohle². Houve o tempo em que só havia escuridão. E se você quer saber da minha opinião, a luz está ganhando.
¹ Se você precisa de nota de rodapé para saber quem é Rocky Balboa, você é burro!
² Rustin Cohle é um personagem do seriado True Detective dono de uma convicção capaz de te impressionar.

segunda-feira, 17 de março de 2014

CAPÍTULO VIII - CENSURA

Todo o final de semana arrastou-se sem que Caio ousasse fazer qualquer coisa produtiva. Preferia ficar inerte na cama, mudando incessantemente o canal da televisão em busca de qualquer programa que não fosse inteiramente boçal – tarefa deveras difícil - para desperdiçar seu tempo do que reunir forças para sair daquela situação. Às vezes tinha a sensação de ter toda a sua energia drenada por forças místicas desconhecidas, mas era cético demais para levar tais pensamentos muito adiante.
Desde que se encontrara com Gordo e André, a notícia da paternidade de seu amigo não lhe saia da cabeça. O pai não seria ele, a responsabilidade não seria sua, mas ainda assim aquele evento trancafiou-se em seus pensamentos como uma criança amedrontada se agarra ao colo da mãe. Logo se surpreendeu em sua vulnerabilidade, afinal, como pudera um evento tão distante da sua influência e da sua interferência, tão longe do seu controle, afetá-lo tanto?
Não gostava daquela sensação, pois, mesmo em todas as dificuldades que aceitava para si, que bancava de bom grado, ainda conseguia dominá-las bem. Sabia para onde ir e possuía firmeza em seus passos, mas como poderia reagir diante do inesperado e daquilo que não era resultado de suas ações? E, se André, que era muito mais perito em aventuras sexuais do que ele havia sido vítima do descuido ou do acaso, como poderia garantir que o mesmo não aconteceria com ele? Era uma boa charada para uma segunda-feira de manhã.
Encontrou-se pensando na condição de pais e de filhos. Sentiu saudades de seu pai, pois se somavam meses desde o ultimo encontro. Ramalho e Lúcia se separaram há cerca de cinco anos. Os motivos da separação eram diversos, porém há de se dar mais crédito à crise financeira que tiveram que enfrentar. A despeito das dificuldades que enfrentavam atualmente, uma vez foram uma família abastada, de posse de imóveis, carros e um luxo que os colocava acima da média.
Ramalho sempre se destacou em tudo o que fez, com exceção das finanças. Aventurou-se a ser dono do próprio negócio e investiu tudo o que podia, e, quando os negócios começaram a ir mal, investiu também o que não podia. Confiou demasiadamente nos banqueiros e em seus funcionários e o resultado de toda esta trama tornava-se previsível. Lúcia se esforçou ao máximo para salvar os bens da família, e se não fosse pelos seus esforços, hoje não teria sobrado sequer a casa em que vive com Caio, e que viveu com sua irmã antes de ela se casar.
O preço dos esforços de Lúcia, entretanto, custou a boa relação que o casal compartilhou durante quase vinte e cinco anos, pois precisou bater de frente e ir contra as decisões do marido em diversas ocasiões. O casamento findou-se quando Ramalho precisou mudar de estado para poder trabalhar e não deixar sua família ir à ruina, afastando-se de sua esposa e de seus filhos. Caio jamais se esqueceria da coragem de seu pai, e buscaria sempre recompensá-lo por isso.
Decidiu que o visitaria naquele dia ao sair do trabalho, já que não teria de ir à faculdade nas próximas semanas e tinha a noite livre.
Ainda a caminho do trabalho, absorto em seus pensamentos, foi resgatado pela invasão de um senhor que parecia estar entre os cinquenta e sessenta anos de idade e que se sentava ao seu lado. Caio rapidamente analisou o figurão. Trajava vestes simples, mas bem compostas, contrastando com seu cabelo branco, ralo e completamente despenteado e que, com o vento da janela, mais parecia dançar sobre a careca daquele homem enquanto ele acenava em determinada direção:
- Está vendo aquele prédio? Ele foi construído na época da ditadura, com o propósito de ser uma instituição de ensino especializado. Veja só sua arquitetura, dois blocos com um vão entre eles, e possuem janelas somente na parte externa. Foi feito assim com um único propósito: evitar que existisse comunicação e o livre transito dos alunos de classes e cursos diferentes. Dessa forma, dificulta-se o contato entre eles. Um verdadeiro tiro no diálogo, na troca de informação e conhecimento entre eles! As janelas foram projetadas para que até mesmo o contato visual fosse vetado! E ainda existem pessoas que pensam que a censura existia apenas de forma explícita ou através da violência... Havia prazer na voz daquele senhor, como se estivesse revelando aquela verdade pela primeira vez.
Conversaram durante boa parte do trajeto sobre várias coisas e sem que a vivacidade abandonasse a voz daquele sujeito. Caio, então intrigado, perguntou sobre sua profissão.
– Sou cientista e artista, ou artista e cientista, como quiser. Se é que existe diferença entre as duas coisas. É. Não mais penso assim, pois a ciência é uma arte, e a arte, diferente do que parece para muitos ou para a maioria das pessoas, possui um mundo de lógica, mesmo que seja só o seu mundo, o que é mais incrível! Pois bem, durante quase toda a minha vida trabalhei com elementos químicos e seu potencial para tornar a vida da nossa espécie mais saudável e mais confortável. Hoje sou aposentado, e minha arte e ciência do momento se resumem em observar o espaço em que vivemos e desvendar sua história e seu significado. Isso diz muito sobre de onde nós viemos, meu jovem, e te digo essa: Quem sabe de onde veio, pode ver pra onde vai!
Rapidamente foi contagiado pelo carisma, conhecimento e empolgação daquele senhor. No início da conversa, exasperara-se por ter sua meditação perturbada, mas àquela altura percebia que havia muito mais a aprender com o conhecimento e entusiasmo do estranho do que com seus próprios devaneios matutinos. Passado pouco tempo, era Caio quem fazia as perguntas, ávido por tudo aquilo que seu recém-colega pudesse lhe dar e que lhe oferecia de bom grado. Enquanto conversavam, Caio desligou a música que sempre ouvia enquanto viajava, o que era raro. Todas as vezes que havia sido incomodado por algum passageiro, ora era alguém pedindo informação, ora algum religioso descabido tentando convencê-lo de sua doutrina ou até mesmo algum pobre coitado resumindo sua vida em três minutos de frases decoradas e muito mal interpretadas com o objetivo de conquistar uns trocados. Mas aquele senhor nada pedia: apenas doava, como se fosse sua missão, como se estivesse ali, resoluto, propondo-se - com o conhecimento de uma vida - a abrir os olhos daqueles que dormem demasiadamente.
Falaram sobre os mais variados temas, como medicina, política, negócios, lazer e até mesmo sobre ocultismo. Caio logo se deu conta de que pouco sabia daqueles assuntos, mas certamente passou a conhecer mais após despedir-se daquele senhor com a estampa da gratidão evidenciada em seu semblante. Somente após alguns minutos, depois de recapitular tudo o que haviam discutido é que se deu conta de que não haviam se perguntado seus nomes, mas isso não passava de um mero detalhe.
Chegou ao trabalho estampando bom humor tão pouco habitual que seus colegas pareciam contagiados.
- Bom dia Sr. Menezes – acenou o porteiro, com um largo sorriso no rosto. Preparado pra mais uma semana? Caio nunca se acostumou a ser chamado pelo sobrenome, muito menos antecedido por ‘senhor’. Não fazia questão desse tipo de formalidade e não entendia a necessidade dela. Não fazia sentido, não para ele.
- E o seu time, heim Caio? Ontem foi por pouco. Pura sorte! – provocou um companheiro da mesma diretoria.
- Chegou o enrolado! – protestava a secretária da repartição dividida entre a brincadeira e a frustração por tentar convidar Caio para sair com ela e o resto da turma por tantas vezes, sempre sem sucesso.
Sentia-se motivado e bem disposto, e logo começou a planejar e ordenar tudo o que deveria fazer. Somente após tirar o celular do bolso é que se deu conta das três mensagens de texto que havia recebido. Todas de Júlia. Não se deu ao trabalho de ler, pois podia predizer o conteúdo. Recentemente todos os chamados de sua namorada pareciam ter se tornado apenas súplicas por atenção às quais Caio não poderia satisfazer.
Tinha para si a triste sensação de que não era sua personalidade, sua forma, suas ideias e todas as suas características que o tornavam tão atraente para ela, mas apenas sua presença, como se qualquer outro homem pudesse desempenhar o mesmo papel sem maiores dificuldades. Não podia descrever bem o que andava sentindo, mas era um misto de insegurança, fracasso e antecipação da sensação de perda diante do inevitável rompimento entre eles, afinal, estava certo de que era só questão de tempo até que a ordem natural das coisas mostrasse sua magnitude e separasse suas vidas.
Quando se deu conta, todo o seu ânimo e disposição haviam sido exauridos pelos pensamentos taciturnos sobre sua situação com Júlia. Entretanto, não se deixou dobrar e tratou de dar início às suas responsabilidades. Executava tudo com uma eficiência incomum. Fora terminantemente contaminado pela vitalidade do encontro com aquele senhor. Dentro de algumas horas havia realizado o que normalmente teria sido feito em todo o expediente. Desejou sair mais cedo para poder passar mais tempo com Ramalho, entretanto precisava cumprir todo o horário em função da burocracia inconveniente.
Aproveitou o tempo ocioso para telefonar para seu pai a fim de avisá-lo da visita.
- Alô?
- Oi pai, sou eu, Caio. Como andam as coisas?
- Oi filho! Tá tudo certo por aqui. E você, como é que está?
- Tudo certo também, sem muitas novidades – precisou se segurar para não se apressar e contar sobre a possibilidade de um novo emprego.
- Que bom. Você está precisando de alguma coisa? – Ramalho estava sempre disposto a ajudar sua família, mesmo quando ele mesmo passava por dificuldades.
- Não, obrigado pai. Você vai fazer alguma coisa hoje à noite? Estou pensando em passar ai pra gente beber umas cervejas, comer um tira gosto... – Caio adorava as invenções culinárias que seu pai fazia. Tinha sempre algo novo preparado, que ele inventava de ultima hora, da própria cabeça.
- Não, meu filho. Ficarei em casa. Que bom que você vem, vou preparar alguma coisa.
- Combinado. Às oito então?
- Combinados! Até breve, meu filho. Obrigado por ligar.
Caio sentia-se entusiasmado para dar a notícia sobre o novo emprego que ainda não havia conseguido de fato, mas que já sentia ser seu. Poderia finalmente começar sua independência financeira e proporcionar uma vida mais tranquila para seus pais. Era apenas o início da caminhada, mas estava disposto a percorrer toda a estrada.
Em suas fantasias, pegou-se imaginando como poderia mudar a vida de seus pais, caso rapidamente se tornasse bem sucedido. Via o sonho de Ramalho se realizando: uma casa na roça com uma pequena plantação, meia dúzia de galinhas e um botequim simploriamente aconchegante nas proximidades. O silêncio, a paz. Já sua mãe estaria numa casa confortável, toda decorada ao seu estilo, tudo muito ajeitado, limpo e organizado, com alguma diarista sempre disposta a ajuda-la. Não era muito, ele sabia, mas era o que seus pais mais desejavam – e por isso faziam-no desejar também - e que ainda estava bem distante da realidade deles.
Quem mais se encontrava distante da realidade, naquele momento, era ele próprio quando sua atenção se fez voltar para o toque do celular. Era Júlia, e só então percebeu que a havia ignorado desde o alvorecer. Conversaram durante cerca de cinco minutos. Para a surpresa de Caio, não havia tom de desagrado em sua voz.
Foi pior.
Havia melancolia no tom de voz de ambos, como soubessem o que estava a sua espera. Foi até o corredor para pegar um pouco de água no bebedouro e, durante a caminhada, sentiu seu coração pesar. Sentia certa dificuldade em respirar, como se precisasse fazer força para inspirar e que o ar inspirado não era suficiente. Quando tentou inspirar uma grande quantidade de ar, sentiu uma leve fincada no peito, mas não deu muita importância. Aquele incômodo – que não sabia julgar se era físico ou emocional – o acompanharia durante toda a noite.

Revisão, direção, apoio e conselhos na madrugada: Paulo Machado

CAPÍTULO VII - FIM DE TARDE

A bela e ensolarada tarde de sábado estava prestes a anunciar o seu fim, quando, pela quarta ou quinta vez, Ernesto foi convidado por sua esposa a sair do escritório, deixar o trabalho de lado para aproveitar com ela e seus dois netos a valorosa família que construíram juntos. Gostaria de continuar ali e finalizar mais alguns detalhes de sua nova empreitada, contudo, seus longos anos de convivência com sua amada companheira lhe ensinaram que umas poucas vezes ela insistia em requisitar sua presença com doçura, entretanto, quando subia minimamente o tom de voz, era a hora de atendê-la.
Nos últimos meses, mais do que de costume, passava grande parte do seu tempo de descanso trabalhando, o que deixava sua esposa um tanto insatisfeita. Mas Ernesto era obstinado, e, vendo aproximar-se sua aposentadoria, entregava-se ainda mais. Já sentia, em seu íntimo, que o trabalho lhe faria falta. Não somente o trabalho em si e todas as atividades que nele desempenhava, mas também a importante posição que ocupava, além da forma com que as pessoas lhes prestavam atenção, a admiração que seus colegas de trabalho tinham por ele... Tudo isso exercia um papel quase central na sua vida. Desejou que sua filha tivesse seguido seus passos, ocupando uma posição semelhante a dele, de preferência trabalhando junto de si, e, dessa forma, poderia manter-se conectado a tudo que conquistara quando se aposentasse, mesmo que mediado por ela. Porém ela havia escolhido uma vida bem diferente, e mesmo tendo recebido educação de altíssima qualidade, contentava-se em ser mãe e dona de casa.
A crescente sensação de esvaziamento que sofreria quando finalmente sua aposentadoria o alcançasse, ele percebia, fazia crescer também suas afeições por Caio. Não sabia exatamente por que, mas sentia que aquele rapaz poderia dar continuidade ao que ele havia construído e ostentado durante anos. Não desvendara inteiramente os motivos, mas enxergava um brilho diferente nos olhos daquele rapaz. Não o brilho da ambição de quem tudo quer conquistar indiferente dos meios para se chegar à glória. Não, Caio era diferente, enigmático e carregava certo mistério em suas atitudes, o que muito interessava àquele homem que caminhava para a terceira idade e cuja maturidade lhe furtava o prazer de ser surpreendido. Seus sentidos diziam que aquele jovem rapaz tinha um caminho singular pela frente, e que não cobiçando a glória, ainda assim teria seu lugar ao sol, o que despertava tanta curiosidade em Ernesto, talvez pelo fato de que ele próprio jamais poderia ter agido de maneira semelhante.
Enquanto ajudava seu neto mais velho com um quebra-cabeça e ouvia sua neta falar sobre os diversos penteados que havia inventado para sua nova boneca, seus pensamentos se voltavam para seu trabalho e para Caio. Vinha se sobrecarregando de tanto trabalho, e, se realmente desejava tentar promover a carreira daquele rapaz, deveria começar a fazer isso desde já. Sentiu-se determinado. Durante a semana ajeitaria tudo na empresa para que pudessem recebê-lo e telefonaria para ele quando tudo estivesse acertado. Gostaria de acompanha-lo de perto, porém decerto não se meteria demasiadamente, pois queria que Caio se resolvesse por sua própria conta.
E não era só em sua carreira que gostaria de participar. Talvez pudesse apresentá-lo às garotas do setor de comunicação. Certamente eram todas boas moças. Contabilizando rapidamente, lembrou-se de Catarina, Rosana, Amanda, e havia ainda Fernanda, que acabara de ficar solteira. Não, não era uma boa ideia, Caio já se encontrava em um relacionamento e em nada disso ele deveria interferir.
Após tomar sua decisão, naquele mesmo dia Ernesto começava a se sentir um pouco mais leve e, ao mesmo tempo, saudoso. Alguma coisa dizia a ele que ali começava todo o movimento de passar a bola para frente, e que terminaria inevitavelmente com alguém ocupando seu espaço, tomando para si, em determinado momento, todas as suas glórias. Diante do quadro, o melhor que poderia acontecer seria conseguir fazer com que Caio fosse esta pessoa.

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